Caso Marielle terá primeiro julgamento após seis anos

Caso Marielle terá primeiro julgamento após seis anos

MP afirma que pedirá pena de 84 anos para os dois executores do assassinato, apesar de acordo de delação premiada
CAROLI ALLEGARI, ROBERTA DESOUZA VERA ARAÚJO granderio@oglobo.com.br
az mais de seis anos que a vereadora Marielle Fran- CO (PSOL) motorista An- derson Gomes foram assas- sinados. Na quarta-feira, 14 de março de 2018, O carro em que os dois estavam foi abordado no bairro do Está- cio. Marielle foi atingida por quatro tiros na cabeça morreu na hora. Na linha de tiro, Anderson também foi baleado e não resistiu. A unica sobrevivente foi a as- sessora Fernanda Chaves, ferida apenas por estilha- ços. Hoje começam a ser gados os ex-policiais milita- res Ronnie Lessa que ad- mitiu ser o autor dos dispa- Élcio Queiroz confessou ter dirigido o vei- culo usado no ataque. Du- rante O juri popular, o Mi- nistério Público do Estado do Rio (MPRJ) buscará pe- na maxima de 84 anos para cada um dos réus. Caberá a sete jurados do Conselho de Sentença decidir pela con- denação ou pelaabsolvição. o pedido pela pena maxi- ma será feito pela Promoto- ria durante o julgamento no IV Tribunal do Juri, apesar de O acordo de colaboração, assinado por Lessa e Quei- roz. prever uma unificação de sentenças, com uma pe- na total entre 20 e 30 anos de prisão.
Como O juri não precisa considerar a delação premi- ada, os jurados vão deliberar levando em conta as qualifi- cadoras e os atenuantes apresentados pela acusação e pela defesa. o advogado criminalista Taiguara Liba- no Soares, professor de Di- reito Penal da Universidade Federal Fluminense (UFF) do Ibmec-RJ, explica queo juri é soberano e não está vinculado ao acordo de cola- boração firmado pelos réus com a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da Re- pública (PGR), ehomologa- do pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Como será audiência de hoje no Tribunal do Júri
Nove testemunhas e os dois réus confessos vão ser ouvidos na sessão. que terá transmissão ao vivo por canal no You Tube
julgamento de Ronnie Lessa e Élcio Queiroz co- meçará às 9h de hoje no IV Tribunal de Juri, no Fórum do centro do Rio, e poderá durar até dois dias. O Minis- tério Público estadual indi- cou sete testemunhas, en- quanto a defesa dos reus, apenas duas. A sessão será aberta com a presença de 15 jurados, no mínimo. Desses, serão escolhidos, por meio de sorteio, sete para compor
juri pode reconhecer as qualificadoras que pode- riam resultar em uma pena extremada. Porém, a meu ver, O juiz tem um vínculo com O acordo homologado. Então, no fim, ele confirma- rá a condenação do juri, se for o caso, mas deve aplicar a pena no limite previsto no acordo dedelação-avalia. No julgamento, a defesa dos reus pedirá redução da pena, considerando a con- fissão do crime. Lessa e Queiroz foram presos em 12 de marçode 2019, pouco tes de os homicídios com- pletarem um ano. MPRJ não quis se mani- festar sobre a possibilidade de pedido de pena maxima contrariar o que foi acorda- do na delação. Os termos da colaboração premiada estão sob sigilo.
Ao confessar o crime em de- poimento à Polícia Federal, Lessa indicou como man- dantes do assassinato de Ma- rielle os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão conse- lheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) e depu- tado federal (sem partido- RJ), respectivamente. Jáo ex- chefe da Polícia Civil e dele- gado Rivaldo Barbosa sado de barrar investigações contra eles. Os três foram presos em março deste ano, mas todos negam qualquer participação. o processo em que os su- postos mandantes são inves- tigados esta no STF, que co- meçou a ouvir na semana passada os envolvidos no ca- so. Em seus depoimentos, Domingos Brazão odelega- do Rivaldo Barbosa tentaram colocar em xeque a delação de Lessa eapontaram pex-ve- reador Cristiano Girão como O mandante do crime. o po- lítico nega a acusação. O conselheiro do TCE afirmou que foi incrimina- do na delação porque Lessa quer proteger Girão, que se- ria seu "comparsa". Ele tam- bem disse que O ex-policial só fez a delação depois de Queiroz, por ter se sentido "acuado, encurralado". As
Conselho de Sentença. Pessoas leigas compõem O corpo de jura- dos que vai julgar O crime. Confunde-se muito, achan- do que O processo inteiro é julgado por pessoas leigas, maseso no final processo explica Beatriz Abraão, doutora e professora de Di- reito Processual Penal da Faculdade Mackenzie Rio. atestemunhade acusação a ser ouvida será
Justiça. grafite em Marielle Franco que foi pintado no local do crime no Estácio: a vereadora e seu motorista foram mortos em março de 2018
Reus. Queiroz Ronnie Lessa. quando foram presos em 2019: os dois confessaran no crime
uma expectativa muito grande. Depois de seis anos e sete meses, nos vamos ter justiça, e nos precisamos de uma justiça digna na condenação desses homens, que são réus confessos. Temos nos mobilizado enquanto família até hoje, enquanto instituto, sociedade, para termos isso"
Marinete da Silva, mãe de Marielle
Fernanda Chaves, à época assessora da vereadora e unica vítima sobrevivente. o Ministerio Público tam- bem convocou mãe de Ma- rielle, Marinete da Silva; a viúva, a vereadora Monica Benicio: a viúva do motoris- ta Anderson Gomes, Ágatha Reis: a peritacriminal Caro- lina Rodrigues Linhares; e os agentes da Polícia Civil Luismar Cortelettili e Car- los Alberto Paúra Júnior.
questões relacionadas aos mandantese motivação do crime devem ficar restritas ao julgamento do STF. que é o foro adequado já que há o envolvimento de um depu- tado federal. Assim como não devem ser tratadas as acusações contra Girão,
Ojulgamento que começa hoje será presidido pela jui- za Lucia Glioche, titular do IV Tribunal do Juri. Os réus vão participar por video- conferência: Lessa, a partir do Complexo Penitenciário de Tremembé, em São Pau- lo: e Queiroz, do Complexo da Papuda, presidio federal em Brasília. Eles respon- dem por duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emboscada recurso que dificultou a de- fesa da vítima) e pela tenta- tiva de homicídio contra Fernanda Chaves.
Se condenados, os ex-PMs já serão afetados por uma de- cisão tomada mês passado pelo STF. A Corte determi-
Em seguida, serão as duas testemunhas escolhidas pe- la defesa de Lessa: O agente federal Marcelo Pasqualetti o delegado Guilhermo de Paula Machado Catramby, da Polícia Federal. Os advo- gados de Queiroz não indi- caram testemunhas.
RÉPLICA E TRÉPLICA
Só após essa parte, começ interrogatório dos réus os dois vão responder a per-
nouqueé possívela imediata da pena da pessoa condenada pelo tribunal do juri, mesmo que ela ainda possa recorrer a outras ins- tâncias na Justiça.
PARAA FAMÍLIA. UMA ETAPA
Como ainda há o processo que tramita no STF, a mãe de Marielle, Marinete da Silva, e irma da vereadora ministra da Igualdade Ra- cial, Anielle Franco, desta- caram que este julgamento é apenas uma das etapas para punir os envolvidos crime.
É uma expectativa muito grande. Depois de seis anos e sete meses, nós vamos ter justiça, e nos precisamos de uma justiça digna na condenação des- ses homens, que são réus confessos. Temos nos mo- bilizado enquanto família até hoje, enquanto institu- to, sociedade, para termos isso disse Marinete, em entrevista ao programa
guntas por videoconferen- cia. Em seguida, a acusação terá a palavra por uma hora e trinta minutos. o mesmo tempo será divido entre as defesas dos dois réus. Então, será oferecida a réplica para acusação, a ser feita em até uma hora, seguida da trépli- ca da defesa, com a mesma duração.
Antes de julgar, os jura- dos serão perguntado se es- tão aptos a proferir a decisão.
Encontro com Patricia Poeta", da TV Globo.
A mãe da parlamentar fa- lou dos anos de busca por respostas e a surpresa com a revelação da participação de Rivaldo Barbosa. O dele- gado esteve à frente do caso no início das investigações. Dias depois do crime, ele chegou encontrar com família de Marielle na casa em que viviam para falar so- bre o compromisso que as- sumia na solução do assassi- nato. A prisão do ex-chefe da Polícia Civil em março deste ano, quando também foram levados à cadeia os ir- mãos Brazão, surpreendeu todos, lembra Anielle:
Tem as imagens dele sentado ao lado dos meus pais, e ele falava para os meus pais: "Faço questão, uma questão de honra, a gente vai desvendar' lembrou a ministra. Para a gente, naquele 25 de mar- ço, se não me falha a memo- ria, num domingo, foi a mai- or surpresa, mas também a maior decepção. Porque a gente espera por justiça. Re- ver essas imagens me em- brulha o estômago.
A viúva do motorista An- derson Gomes, Ágatha Reis, também falou sobre O julga- mento e como foram os últi- mos seis anos sem o marido, tendo que viver a materni- dade - o filho Arthur tinha 1 ano e 10 meses na época da morte dopai.
Me peguei pensando em tudo O que aconteceu nesses últimos seis anos. Nãoso tempo que levamos buscando justiça pelo An- derson e pela Marielle, mas também a pressão que a gente teve que fazer muitas vezes, toda a caminhada que foi necessária para chegar aqui, chegar até o juri.
Eles têm a faculdade de fazer perguntas, não ali na hora da audiência, mas através do juiz. Eles perguntam ao juiz, pergunta é feita se for ne- cessário, para prestar algum esclarecimento antes de eles decidirem a questão-expli- ca Beatriz Abraão. Em seguida, os jurados se- guem para a votação na sala secreta, respondendo que- sitos sobre a existência ou nãodocrime. Nasequência, juiz elabora a sentença estipula a pena, de acordo com esses quesitos. julgamento terá trans- missão ao vivo pelo canal do Tribunal de Justiça do Esta- do do Rio no YouTube.